Amor preto cura, de Camila Maria N da Silva
Desenho de Andressa Marques
AMOR PRETO CURA
Camila Maria N. da Silva
09 de junho de 2020
Fomos ensinados a nos odiar. Nós odiamos nossos traços, nossa história, nosso cabelo, nossa ancestralidade. Quem nos ensinou a nos sentirmos assim? A sermos sempre menos, menor, pior?
Essas dores nos circundam e permeiam a nossa existência desde o momento em que fomos trazidos ao mundo. No parto, atendido por um profissional desleixado, vez ou outra, que atende com a ideia do imaginário coletivo que acredita na nata força preta feminina. Que não precisam de tanta anestesia, que não precisam de tanto cuidado na sutura. Obtemos nas primeiras relações sociais, na famigerada última colocação do mais belo da sala, na ideia vendida de amor, que não podíamos comprar, afinal não podia escurecer, na indústria que trazia padrões impossíveis de se ser e as frequentes frustrações que esse processo pode trazer. Já pensou que absurdo amar alguém como você? De todos os lados, vivemos e somos atingidos pelo ódio. E, quando percebemos a origem de tais comportamentos, frutos da construção racista de nosso país, a raiva aumenta, e trazendo revolta e impotência.
Nada disso é saudável, nada disso é gostoso de se sentir, ninguém escolhe querer viver assim.
Quando estamos sem norte, em meio a esse caos o que pode nos salvar? O que cura essa dor ancestral que sentimos e trazemos no sangue?
Gostaria de ter completa tão complexa resposta. Pode parecer piegas e óbvio, mas penso no amor. Esse amor que nos une pela dor. O amor por nós, pretos e pretas.
Sempre ouvi a expressão amor preto cura e nunca entendi muito bem, (e ainda não entendo) como funciona esse processo. Talvez se refira a quando nos conectamos com a ancestralidade e o pedaço da África que está presente em nós mesmos ou no nosso irmão, quebrando grilhões que nos prendem há séculos a fim. E a partir daí, reconstruímos nossa História dizendo um para o outro (e para nós mesmos) o quão lindos somos e como é importante a nossa existência.
Amor preto cura, não necessariamente apenas dentro de uma relação afetiva sexual, afrocentrada, mas também nas relações familiares, dentro do seu lar, junto com os seus, no seu território e seu lugar. E para, além disso, as amizades, aquela famosa outra família, outras vidas que se unem a sua por algo maior, mesmo sem perceber. Valorize as relações que são curativas. Mas, primeiramente, é importante dar valor à relação consigo mesmo. A autoestima e autoamor, o ato de olhar para si e seus traços e sua história aceitá-los com carinho e cuidado. Na sua completude se permitir aceitar incompleto e lindo.
AMOR PRETO CURA
Camila Maria N. da Silva
09 de junho de 2020
Fomos ensinados a nos odiar. Nós odiamos nossos traços, nossa história, nosso cabelo, nossa ancestralidade. Quem nos ensinou a nos sentirmos assim? A sermos sempre menos, menor, pior?
Essas dores nos circundam e permeiam a nossa existência desde o momento em que fomos trazidos ao mundo. No parto, atendido por um profissional desleixado, vez ou outra, que atende com a ideia do imaginário coletivo que acredita na nata força preta feminina. Que não precisam de tanta anestesia, que não precisam de tanto cuidado na sutura. Obtemos nas primeiras relações sociais, na famigerada última colocação do mais belo da sala, na ideia vendida de amor, que não podíamos comprar, afinal não podia escurecer, na indústria que trazia padrões impossíveis de se ser e as frequentes frustrações que esse processo pode trazer. Já pensou que absurdo amar alguém como você? De todos os lados, vivemos e somos atingidos pelo ódio. E, quando percebemos a origem de tais comportamentos, frutos da construção racista de nosso país, a raiva aumenta, e trazendo revolta e impotência.
Nada disso é saudável, nada disso é gostoso de se sentir, ninguém escolhe querer viver assim.
Quando estamos sem norte, em meio a esse caos o que pode nos salvar? O que cura essa dor ancestral que sentimos e trazemos no sangue?
Gostaria de ter completa tão complexa resposta. Pode parecer piegas e óbvio, mas penso no amor. Esse amor que nos une pela dor. O amor por nós, pretos e pretas.
Sempre ouvi a expressão amor preto cura e nunca entendi muito bem, (e ainda não entendo) como funciona esse processo. Talvez se refira a quando nos conectamos com a ancestralidade e o pedaço da África que está presente em nós mesmos ou no nosso irmão, quebrando grilhões que nos prendem há séculos a fim. E a partir daí, reconstruímos nossa História dizendo um para o outro (e para nós mesmos) o quão lindos somos e como é importante a nossa existência.
Amor preto cura, não necessariamente apenas dentro de uma relação afetiva sexual, afrocentrada, mas também nas relações familiares, dentro do seu lar, junto com os seus, no seu território e seu lugar. E para, além disso, as amizades, aquela famosa outra família, outras vidas que se unem a sua por algo maior, mesmo sem perceber. Valorize as relações que são curativas. Mas, primeiramente, é importante dar valor à relação consigo mesmo. A autoestima e autoamor, o ato de olhar para si e seus traços e sua história aceitá-los com carinho e cuidado. Na sua completude se permitir aceitar incompleto e lindo.
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