AMOR RETINTO

Ilustração de Ana Carolina Gomes da Silva.

AMOR RETINTO

por Camila Maria N. da Silva

Deitei em mim
Banhei-me de ouro
Como meus ancestrais
Imergi nas profundezas das minhas complexidades

Abracei-me
Acalentada por um doce eu
Dizendo repetidamente no pé do ouvido
“eu te amo”

Cheia
E transbordante de afetos
Antes negados
Ainda negados
Surrupiei em silêncio
O que é meu por direito

Me empoderei do lugar que ocupo
E trouxe na bagagem a história que construí
Que me construiu.

Congelei o agora
Pensando no amanhã
Corri os olhos pela face
Encarando-me no espelho
Vi o rosto marcado
Por traços marcantes
Que fugiam do esperado

Tão sereno
Tão forte
Tão belo

Sorri abobada
Ao perceber
Não desejar mais nada
Além daquilo que se vê

Revolucionariamente encantada
Com a beleza extraordinária
Com o grande pedaço de África
Que transparece em mim
Subitamente suscitada pelo desejo
De despertar a consciência
Da minha história
Do meu passado
Do meu corpo
De mim.


Abram alas para a rainha
Que estava adormecida
E despertou em fim
Ninguém para essa mulher
Nada abala esse negro amor
Que depois de tanto não
Permitiu-se dizer-se
SIM.

Se ame
Se baste
Se cuide.

Seja de si dona
Seja de si amada
Se permita ser curada
Pelo amor retinto.
Seja de si
O afeto que falta.

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