DONA DOIDA, de Adélia Prado

 DONA DOIDA



Adélia Prado


Uma vez, quando eu era menina, choveu grosso

com trovoadas e clarões, exatamente como chove agora.

Quando se pôde abrir as janelas,

as poças tremiam com os últimos pingos.

Minha mãe, como quem sabe que vai escrever um poema,

decidiu inspirada: chuchu novinho, angu, molho de ovos.

Fui buscar os chuchus e estou voltando agora,

trinta anos depois. Não encontrei minha mãe.

A mulher que me abriu a porta riu de dona tão velha,

com sombrinha infantil e coxas à mostra.

Meus filhos me repudiaram envergonhados,

meu marido ficou triste até a morte,

eu fiquei doida no encalço.

Só melhoro quando chove.


Fonte do texto: <https://www.culturagenial.com/poemas-adelia-prado/>.

Fonte da imagem: <https://pixabay.com/pt/illustrations/flor-girassol-fundo-borboleta-4124558/>.

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