Mulheres na Ciência

 

A trajetória da professora Maria da Glória Ribeiro Moss

 

Manuella Abrantes Saraiva Lacerda (Turma: 2B)


 

Um dos assuntos que mais vem ganhando visibilidade nos dias atuais é a inserção e incentivo das mulheres nas áreas das diversas ciências. Apesar disso, as coisas nem sempre ocorreram dessa maneira, pois muitas mulheres não tiveram a oportunidade de estudar em uma escola. Sendo consideradas inferiores e possuindo apenas a função de cuidar da casa e dos filhos. Quando alcançavam pequeno protagonismo, eram somente como assistentes de cientistas homens, e não recebiam nenhum crédito pelo trabalho, tendo os seus nomes completamente apagados. “É o caso da Química Alice Ball que teve o seu trabalho, utilizando o óleo de chaulmoogra para o tratamento da hanseníase, atribuído a seu orientador Lyman Dean, sem qualquer menção a ela. Sua história só foi resgatada posteriormente por duas pesquisadoras”.

Essa série de artigos sobre mulheres na ciência tem como principal objetivo trazer visibilidade para cientistas que, devido ao machismo, muitas vezes não foram consideradas capazes de fazer ciência e que lutaram e lutam diariamente para ter um lugar e serem respeitadas na comunidade científica. Inicialmente falarei da cientista Maria da Glória Ribeiro Moss, que nasceu no dia 21 de abril de 1904 e rompeu barreiras se formando em duas graduações, Farmácia e Direito.

Foi, em 100 anos, a primeira mulher a ocupar o cargo de professora suplementar no Colégio Pedro II e permaneceu nesta função desde o ano de 1926 até 1937. Em 1933 ela se candidatou ao cargo de professora catedrática de Química, isto é a categoria docente mais importante no Colégio Pedro II, responsáveis por orientar o ensino das matérias que compunham a sua cadeira; lecionar as matérias do programa. Neste concurso, apresentou a tese “Novo Processo Catalítico de Analyse Orgânica”. Na capa e contracapa da tese, Moss cita informações importantes, como detalhes sobre as suas formações e locais onde já foi contratada como docente e outros trabalhos voluntários.

A professora, em sua tese que tratava da busca por catalisadores alternativos à platina, propõe o uso da combustão orgânica com oxigênio como um método simples e preciso de análise química. Também realizou um breve histórico dos estudos sobre catalisadores, desde Humphry Davy até o desenvolvimento do método pela autora Maria da Glória.

Maria da Glória foi a única mulher que participou do concurso, nos anos de 1933 e 1937, assunto que chegou até a constar nos jornais da época, devido à grande repercussão. Houve algumas polêmicas em torno deste processo seletivo e o mesmo ficou conhecido como “O famoso concurso de Química.” De acordo com as informações coletadas, o concurso foi interrompido devido divergências na comissão examinadora, além de diversas irregularidades, tais como: a indicação de três membros estranhos à congregação do colégio, feita pelo Comitê de Educação do Governo, ou pela atribuição de notas que não condiziam com o desempenho dos candidatos.

A cientista, mesmo sem ter sido aprovada, obteve um reconhecimento notório após a defesa de sua tese, o processo de Análise Orgânica lhe rendeu uma patente, tornando claro seu interesse em fazer pesquisas laboratoriais. Ela sempre teve o intuito de trazer cada vez mais informações para as suas aulas, ação que demonstra sua grande dedicação ao magistério.

Em 1939, houve 2 vagas para professor catedrático de Química, e Moss se mostrou resiliente e se inscreveu novamente, mesmo sabendo que nessa época não era comum ter mulheres ocupando cargos de prestígio. Dos quatro escritos, ela foi a única a manter o mesmo tema do concurso anterior, apresentando a tese chamada: “Catalyse”. No final do processo seletivo, os cargos foram ocupados pelos professores Luiz Pereira de Castro Pinheiro Guimarães e Gildásio Amado.

Maria da Glória utiliza o espaço de seu trabalho destinado ao prólogo para demonstrar a sua insatisfação com o rumo que o concurso de 1933 tomou, por meio das palavras: “a falta de carinho com que foi tratada a tese anterior, que no estrangeiro logrou menção honrosa”. Suas considerações terminam com a frase em latim, “justitia exspectatur”, que pode ser traduzida como “a justiça é aguardada”, reforçando o sentimento de injustiça e descaso, e a esperança de que dessa vez alcance o seu objetivo.

A autora deixa claro que defende a abordagem da catálise e que existe uma grande relação entre esse tema e o conteúdo estudado com os alunos do 5 ano. Moss finaliza a tese, na página 65, defendendo que a parte prática de Química orgânica, é indispensável aos alunos da quinta série, e que espera ter honrado os seus “inesquecíveis professores de Química”, estimulado em seus discípulos o gosto pela disciplina.

Desta forma, é nítido que as mulheres sempre foram excluídas ou impedidas de ocupar locais no qual há predominância masculina, no entanto, com o movimento feminista ganhando cada vez mais força é possível alterar essa situação. A professora Maria da Glória, com sua enorme história, que infelizmente não possuímos muitas informações sobre, deve servir de inspiração para que outras mulheres ocupem o lugar que desejarem. Após a leitura deste texto, devemos lembrar que, se nos dias atuais existem mulheres lecionando no Colégio D. Pedro II, foi porque essa incrível professora teve a coragem de dar o primeiro passo, e cabe a todas as mulheres que têm o sonho de atuar na área científica nunca desistirem dos seus sonhos.


Referências bibliográficas:

ALVARO, Marcela Vitor. As mulheres no ensino de química: a trajetória da professora Maria Da Glória Ribeiro Moss no Colégio Pedro II, 2021. Trabalho de Conclusão de Curso (Especialização em Ensino de Química) – Colégio Pedro II, Pró-Reitoria de Pós-Graduação, Pesquisa, Extensão e Cultura, Rio de Janeiro, 2021.

PEREIRA, Letícia dos Santos; SANTANA, Carolina Queiroz; BRANDÃO, Luís Felipe Silva da Paixão. O apagamento da contribuição feminina e negra na ciência: reflexões sobre a trajetória de Alice Ball. Cad. Gên. Tecnol., Curitiba, v.12, n. 40, p. 92-110, 2019.

SOARES, Jefferson da Costa. Dos professores “estranhos” aos catedráticos: aspectos da construção da identidade profissional docente no Colégio Pedro II (1925-1945). 2014. 281p. Tese (doutorado em Educação) – Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Programa de Pós-Graduação em Educação do Departamento de Educação da PUC-Rio, RJ, 2014.

SILVA, Fabiane F. d. Mulheres na ciência: vozes, tempos, lugares e trajetórias. 2012,

147p. Tese (doutorado em Educação em Ciências – Universidade Federal do Rio Grande, Programa de Pós-Graduação em Ciências: Química da Vida e Saúde, RS, 2012.

BERNARDO-GUSMÃO, Katia; PERGHER, Sibele BC; SANTOS, Eduardo N. dos. Um Panorama Da Catálise No Brasil Nos Últimos 40 Anos. Química Nova, v. 40, p. 650-655, 2017.

DE OLIVEIRA, Paloma Rezende; COSTA, Nailda Marinho. O percurso da professora Maria da Glória Ribeiro Moss no Colégio Pedro II. Revista HISTEDBR, v. 19, 2019.

 

Fonte da imagem: <https://br.freepik.com/vetores-gratis/cientista-femea_6528754.htm#page=23&query=mulher%20quimica&position=32&from_view=keyword&track=ais&uuid=93976739-6bc1-49df-9cea-ec70c6904fbd>.

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