FINAL ALTERNATIVO PARA CLARA DOS ANJOS DE LIMA BARRETO #2

 



Texto 1: Isabela Dias Ferraz, turma 3B

 

Enquanto Clara aguardava sua vez de liberdade, mantinha seus braços tensos ao lado do corpo, evitando assim qualquer aproximação de seu ventre. Não queria sentir aquilo dentro de si, não conseguia nem ao menos chamar de quem, mas o que. Era uma maldição, a prova do papel de tola que a impuseram. A sua volta via mulheres desoladas, abandonadas, mulheres que assim como ela, não eram ninguém para o mundo. 

Sentindo-se cada vez mais aprofundada em sua bolha escura de pensamentos intrusivos, injustas autoacusações e inseguranças, alguém a estoura pelo simples ato de sentar-se ao seu lado. Respira fundo tentando manter a calma, quando a estranha chama sua atenção. 

— Não se preocupe, isso vai acabar logo. 

Quando realiza que tinha uma lágrima perdida em seu rosto, Clara opta por virar o rosto ao invés de secá-la, para não deixar a outra deduzir que estava a chorar. Queria convencer a todos e a si mesma de que poderia passar por aquilo sem sinais de fraqueza, tentando se desfazer da imagem de menina indefesa que ainda guardava de si e a atormentava. Empurra saliva por sua garganta evitando vestígios de falhas na voz e compartilha um pouco de seus pensamentos. 

— E se não acabar? E se eu não conseguir me perdoar? Sem um piscar de hesitação, como se fosse uma ofensa pessoal, a mulher retruca. 

—  Bom, em primeiro lugar, o homem que contribuiu se perdoou?

 — Ele não precisa se perdoar, nem conhece o que é culpa. 

— A culpa não é nada mais do que um termo religioso, criado para nos fazer temer o inferno e medir nossas ações. Me diz, menina, por que você está aqui sozinha carregando toda essa culpa? 

— Todo o caminho que eu segui pra chegar aqui, um pequeno erro atrás do outro e nada que eu vivi poderia ter me preparado pra esse momento aqui… E o que eu vou fazer agora, eu nunca pensei que teria que fazer e não sei como vou passar a me ver depois disso. Ainda mais quando me lembro do que aquele homem fez comigo sem nenhuma hesitação. 

— Vou te interromper por aí, criança. O que quer que ele tenha feito, não tem nada a ver com sua pessoa. E o que você vai fazer pode ser uma marca da ausência de amor dele, mas uma prova do seu próprio. 

Agora com os pensamentos em branco, aberta aos conselhos daquela completa desconhecida, Clara a encara com sua feição confusa. 

— Como vir para esse lugar pode ter qualquer coisa a ver com amor-próprio? 

Com o acolhedor contato visual, a mulher sorri com a ingenuidade da jovem, soltando um curto riso anasalado.

— É simples, tudo sobre respeito. Você se ama e se respeita o suficiente para reconhecer seus limites, está dando o próprio rumo da sua vida. Sabe o que não vai te trazer saúde ou felicidade e está se protegendo. Isso é amor. 

Após um curto período de introversão, preenchido pelo som de conversas externas, Clara se apoia em seus joelhos e pondera.

 — Não, eu não acho que eu me ame assim não. É só... Sobrevivência. Eu pensei que ele me amasse, como ninguém nunca amou. Mas eu caí na realidade que não sou ninguém. 

— Como pode não se amar, quando você é a maior guerreira lutando pela sua vida? 

As palavras passeiam pelo imaginário da menina, que se fantasia como uma forte sobrevivente. A linha de pensamento é cortada por uma terceira, que se aproxima em silêncio. A mulher de palavras bonitas se levanta e a acompanha, mas não pega sua bolsa antes de deixar seu último recado. 

—  Olha, eu vou te dar um conselho. Você está com medo de que isso acabe, mas não deixe seu corpo por completo. Para você seguir em frente, você deve matar o homem que fez isso com você. 

A mente literal da jovem a deixa alerta e assustada com aquela forte imposição.

 —  Como? 

— Pode demorar um tempo, mas um dia ele não passará de um fantasma, querida. Quando cada parte dele morrer dentro de você, tudo que você terá são experiências e aprendizados. Não será fácil, mas você tem que matar dentro de você tudo aquilo que lhe impede de se amar o suficiente. Se amar o suficiente para se priorizar em momentos como esse.

 Assim, sem saber o nome uma da outra, elas se despedem. Uma interação imprevisível e um aprendizado que levará muito tempo para de fato ser aprendido. Mas agora Clara não temia o espelho, ela o abraçava.

 

Fonte da imagem: <> https://pixabay.com/pt/illustrations/mulher-rosto-afro-pele-negra-7028323/


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