Nós de nós
por Karine André
Próximo a minha antiga casa, em frente ao metrô de São Francisco Xavier, costumava ficar uma feirinha de artesanatos que vendia, sobretudo, roupas de crochê, lã e tricô. Nunca soube diferenciá-los.
Um dia, vindo da faculdade, passei pelo local, como de costume, e me deparei com os restos do que antes ali existia. Tudo havia sido devastado. Ao lado dos destroços, sentada no meio-fio com seu carrinho de feira, repousava uma senhora de olhar melancólico. Ao seu lado, no chão, encostada no carrinho, havia uma placa improvisada onde se lia: "Roubaram nossos nós". Li uma, duas, três, quatro vezes a mensagem, tentando decifrar o sentido daquela formulação. Roubaram seus materiais de trabalho. Roubaram seus tecidos, seus novelos, seus fios, seus pontos, seus nós. Após um pouco relutar, cheguei à conclusão de que, talvez, o sentimento de perda registrado na placa estivesse referindo-se a outra instância. Não só apenas lhes roubaram a materialidade, aquilo que um dia forneceu-lhes o sustento. Roubaram-lhes o eu, o íntimo de cada um, de um coletivo, de todos nós.
Roubaram nossos nós de nós!!
Rio, 24 de setembro de 2015.
Fonte da imagem: https://www.pxfuel.com/pt/free-photo-ekpko
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