A JUVENTUDE QUE VEJO Rio de Janeiro

 


Por Camila Maria Nascimento

 

É comum ouvir disparos antes de dormir. Penso se não acertou o Henrique dessa vez. 16 anos, jovem demais pra trabalhar, deu seu jeito. Espero que volte logo antes que seja tarde

Consideraria equivocada a ideia de juventude perdida, se não fosse essa a que vejo todo dia. Uma juventude alvejada, por todos os lados, ora por projéteis desesperados, despreparados... ora pela sua própria mão, que encontra no sague do pulso o alívio. Quem disse que preto não sente dor? Foi Branco né?  As prisões lotadas, o medo constante, da bala. Mais um dia comum na periferia.

Depressão o tal mal do século, ansiedade, bipolaridade, a juventude que vejo, sente, sente demais, mais do que qualquer outra juventude já pode sentir. Quem diria que sofrimento seria privilégio. Eles sofrem. Cuidam. E curam. Boto fé nos frutos dessas terapias, nos adultos paridos desse mar revolto, que ora afoga, ora renova, as energias. Dias bons e ruins.  Mas ainda assim, dias. 

A juventude que eu vejo ao abrir o portão sorri despreocupada, anda de moto como se fossem reis. E de fato são. Se ao menos soubessem... Se tivessem lhes dito, que sua vida vale mais que uma nota de 200 reais, que foi por amor a luta de seus ancestrais... Tão novos, ainda tanto pra viver, mas se vão tão rápido que mal consigo gravar seus rostos, sei que comiam quentinhas embaixo do sol, com o rádio na cintura, bonezinho pra trás... não lembro mais. 

Mas eles fazem também, e como fazem, arte então? Contam história no seu corte de cabelo, pintam muros com riqueza de detalhes, mensagens, beleza. Falam o que tem que ser dito, com as rimas pesadas, pensadas ou de improviso. Eles fazem tudo.

Gustavo, Yuri, Gabi, Pedro, levantam essa juventude dita perdida, trazendo paz e a autoestima, pra aqueles que se sentiam insignificantes sem saber que são partes de algo grande, maior do que dizem que somos, ou que devemos ser. Talvez hoje, o maior desafio da juventude que vejo, seja viver. Por isso espero que vivam, e encontrem na sua existência, a indignação necessária pra mudar essa realidade, assim como fazem, como tem feito até hoje, independente do que se espera nessa idade.

 

Fonte imagem: acervo pessoal de Camila


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